segunda-feira, 31 de agosto de 2009

O Ciúme II




"O ciúme doi nos cotovelos
Na raiz dos cabelos
Gela a sola dos pés
Faz os músculos ficarem moles
E o estômago vão e sem fome
Doi da flor da pele ao pó do osso
Roi do coccix até o pescoço
Acende uma luz branca em seu umbigo
Voce ama o inimigo
E se torna inimigo do amor
O ciúme doi do leito a margem
Doi pra fora da paisagem
Arde ao sol do fim do dia
Corre pelas veias da ramagem
Atravessa a voz e a melodia"

Caetano Veloso - Dor de Cotovelo

terça-feira, 25 de agosto de 2009

O Ciúme I

“Com o tempo aprendi que o ciúme é um sentimento para proclamar de peito aberto, no instante mesmo de sua origem. Porque ao nascer, ele é realmente um sentimento cortês, deve ser logo oferecido ao outro como uma rosa. Senão, no instante seguinte ele se fecha em repolho, e dentro dele todo o mal fermenta. O ciúme é então a espécie mais introvertida das invejas, e mordendo-se todo, põe nos outros a culpa de sua feiúra.”

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Poesia dos Sentidos

Afirmo que o amor é um sentimento em alta porque vejo amor nas coisas, nas pessoas, nos comportamentos, nos e-mails recebidos e enviados, no arroz salgado demais. Vejo amor em tudo.

Um dia desses ao chegar no trabalho encontrei um ex-funcionário na portaria. O nome dele é Pedro, o Seu Pedro, como desde sempre eu ouvira falar. Negro, 1,75m , educado e com voz macia, com o português sempre impecável, Seu Pedro era "o cara" da empresa. Encanador, pedreiro, motorista, mecânico, churrasqueiro e tocador de sanfona. Cuidava da mulher doente, que tinha uma paralisia nos membros inferiores, mas nem por isso deixava de acompanhar o marido. Todas as festas da empresa lá estavam os dois. Todos adoravam o Seu Pedro.

Foi esse o homem que encontrei. Já está viúvo, tem duas pontes de safena, não trabalha mais, está aposentado. Quando cheguei lembrei-me que quando era pequeno adorava aquele "negão" dos dentes brancos. Sempre que me via, abria um sorriso que era impossível não retribuir. Dessa vez não foi diferente.

“Olá como vai ? Eu vou indo, e você, tudo bem?” Já o tinha encontrado por aqui outras vezes conversando com o porteiro, o mesmo que trabalhava com ele anos atrás, contando "causos" antigos, relembrando personagens pitorescos; mas pelo que percebi o assunto e o ar da conversa eram outros: Seu Pedro arrumou uma namorada. Tinha acabado de encontrá-la e como um juvenil apaixonado veio contar as novidade para os antigos amigos. Quando soube da novidade me interessei mais ainda pelo encontro inesperado e, um tanto quanto intrometido, entrei na conversa.

Soube então para minha surpresa que o "negão do sorriso branco", agora com 79 anos, arranjou uma namorada pela internet, numa sala de bate-papo, num computador que o neto torrou a paciência da mãe para comprar e que agora tinha que dividir com o vovô.

E ele me contou com tanta naturalidade que cortou minha surpresa inicial. Apenas escutei sobre o encontro, sobre como ele estava feliz, mas resolvi não fazer nenhuma pergunta. Desejei felicidades e me despedi.


" O amor é a poesia dos sentidos. Ou é sublime, ou não existe. Quando existe, existe para sempre e vai crescendo a cada dia."


O amor no Seu Pedro é sublime assim como é o meu amor .

Viva o amor !

quarta-feira, 29 de julho de 2009

O Guerreiro e o Amor


A saudade é mesmo um pouco como fome, como diz Clarice: “– Só passa quando se come a presença”, mas é também o catalisador para a ebulição de sentimentos que nem sempre se colocam a mostra. De repente aparece um arco-íris absurdamente nítido, do nada entra pela janela do carro um aroma de flores que te faz fechar os olhos e então o olfato é o único sentido a trabalhar por alguns segundos, descobre-se a “mensagem” daquela canção que já tocou milhares de vezes e só agora fez sentido, a vida fica insustentavelmente mais leve, com a leveza que se tem numa vida simples.

Com esse sentimento entrei para assistir ao filme “O Guerreiro Genghis Khan” – (Nome Original: Mongol; Direção: Sergei Bodrov). O filme mostra a história de Genghis Khan, um dos maiores conquistadores de todos os tempos, dominador de metade do mundo e que conseguiu, em meio a uma Mongólia povoada por diversos clãs, unificar todos os povos. O filme tem a típica trajetória do herói (bem ao estilo Luke Skywalker, Jesus Cristo ou Willian Wallace), com uma fotografia belíssima. O que torna esse filme cativante a meu ver - principalmente após ter confessado meu estado emocional – é o amor. Foi ele quem conseguiu unir povos tão distintos. Foi ele quem fez com que o herói percebesse que não se ama, ou se uni ou se relaciona somando-se as compreensões. O herói percebeu, e só por isso tornou-se herói, que só se ama verdadeiramente somando-se as incompreensões.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Soneto do reencontro

Eu vi chegar lento os meus nos seus lábios
A luz por detrás dos cabelos claros
Nosso encontro também foi lento, sábios
Sabíamos viver os momentos raros

Quando eu dei por mim, já era algo novo
A mente apavora o novo mundo
Fugi de nós. Patético em vôo
Para o deserto, em sono profundo

Três longos séculos nos separaram
A vida reduzida à solidão
Mas que vida? Não mais vivia, notaram

E levaram-me para minha sina
Acordei com um beijo de paixão
Em um bar, por detrás de uma cortina.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

A espera



Uma leitura Barthesiana...


“ESPERA : Tumulto de angústia suscitado pela espera do ser amado, ao sabor dos mais ínfimos atrasos (encontros, telefonemas, cartas, retornos).”


Quando ela chegou ao lugar do encontro, um café no centro da cidade, percebeu que estava cinco minutos adiantada. Tinha sido proposital a chegada antecipada. Não queria perder nem um só momento, quiçá correr o risco de se atrasar. Ele poderia não gostar. Quem sabe até chegar ao desvario de achar que ela não viria e, assim, ir embora.
Pois lá estava, mergulhada numa cadeira confortável, de braços envolventes e assento macio. Esperava. Não era ainda uma espera violenta. Era marcada de irrealidade, reparava em tudo e todos a sua volta: entravam, saiam, conversavam, riam e brincavam – eles. Eles não esperavam.
E logo se imaginou dentro de uma peça, num teatro. Tudo aquilo era uma encenação da qual ela era a única personagem. Todos faziam parte do cenário e ela se viu no prólogo da peça: constatou que esperava. Sozinha.
O atraso, até aí, era computável, não passava de uma entidade matemática. Começou então a olhar o relógio desesperadamente. Passaram-se dez minutos desde a sua chegada e nada. Ela já olhara no relógio inúmeras vezes - nove pra ser exato, quase uma por minuto - e nada. A entidade matemática, como quase todas as outras semelhantes, passou a incomodá-la. O prólogo terminava com uma decisão: sucumbir à angústia da espera.
Passou do prólogo para o primeiro ato. A encenação a seguir era marcada por inquietações que a deixaram imóvel, estática.“Não posso sair daqui. E se ele aparece e não me vê?. Devo ligar? Não, ele pode tentar ligar na mesma hora e dar ocupado. Vai achar que eu não me importo. Será que vim mesmo ao lugar certo? Tem tantos cafés no centro da cidade”.
Mais duas olhadas ao relógio, agora eram onze vezes, quinze minutos. A encenação continuava:
“-Será que não marcamos em outro horário? Pode ser que ele tenha chegado e não tenha me visto. Devo ir até a porta? Será que é esse café mesmo? Não, não pode ser”.
Depois da negação, de não acreditar no que estava acontecendo, começou o segundo ato: a cólera.“Ele não poderia fazer isso comigo. Nem ao menos uma satisfação... Ele poderia ter ao menos... Porque ele está fazendo isso comigo?"Depois de tantas perguntas e de mais de quase uma hora, ela percebeu que algo de errado “deveria" ter acontecido. Na verdade, só poderia ter acontecido algo.
Iniciou-se então o terceiro ato: a pura angústia, a angústia do abandono. Da ausência à morte em uma hora: ela estava interiormente em luto e, por dentro, chorava a morte do outro, sofria por ele, dedicava sua compaixão, seu reconhecimento ao “problema” – a ausência indesejada dele. Ela perdoou o atraso, na verdade já tinha certeza que a culpa não era, não poderia ser, dele. Ele não faria isso, não é de seu feitio, impossível acreditar. Acontece que já se passou uma hora e cinco minutos desde a sua chegada. O “cenário” começava a interagir com olhares curiosos, depois de estranheza e, enfim, de discriminação. O cenário não mais estava imune, ele a recriminava e a deixava desconfortável. Era hora de ir.
Caso ele tivesse chegado no prólogo ou no primeiro ato, ela o receberia e o encontro dar-se-ia como o “planejado” – pelo menos por ela.
Se por acaso a chegada acontecesse no segundo ato, aconteceria uma cena. A loucura no auge seria canalizada em indignação, briga, reconciliação e aconteceria o encontro.
Contudo se a chegada acontecesse no terceiro ato, no momento da compaixão, do sentimento de compreensão pelo qual ela fora tomada, as coisas seriam diferentes. E foram.
Ela suportou a espera, a solidão, a indignação, a raiva, a loucura, a estranheza e discriminação do “cenário”, porém não suportou o desprezo de sua compaixão, de sua preocupação.De repente, percebeu um vulto parecido com ele. A princípio não reagiu, já estava calejada pela quantidade de alucinações que o delírio da espera havia lhe causado, vendo-o em outros, em todos que se aproximavam. Porém, dessa vez, era ele. Esticou um pouco o pescoço para se certificar que era mesmo ele. Sim, o próprio, e pior de tudo: estava bem, estava vivo.
Levantou-se calmamente da cadeira onde se encontrava crispada, a mesma cadeira que nesse momento já quase fazia parte do seu próprio corpo, e caminhou lentamente para a saída dos fundos, não sem antes parar escondida atrás da máquina de café que estava no balcão e percebê-lo sentado, olhando o relógio, no prólogo da peça que, para ele, começava e que ela agora não tinha mais interesse em assistir. Deu as costas e partiu.
Sentou-se no ônibus e quase teve vontade de chorar. Quase, mas percebeu que o sentimento não era mais esse, não tinha dor suficiente para que chorasse. Sentiu-se confusa, sem saber ao certo o que deveria fazer. Tirou a agenda da bolsa, pegou um lápis e escreveu:
“Serei tua quando passares cem noites com seu violão em meu jardim, sob minha janela, disse a menina ao rapaz. Mas, na nonagésima nona noite, ele se levantou, colocou o violão debaixo do braço. e partiu.”
Fechou a agenda, olhou para o trânsito e sorriu, imaginando uma cortina de veludo bem grossa se abaixando e a platéia em pé aplaudindo.
imagem: Gustavo Rosa

terça-feira, 8 de janeiro de 2008


ENQUANTO ESTEVE VIVO, VIVEU !



Homenagem ao aniversário da "Baleia". Música, sensibilidade e sentimentos por todos os poros.

"Amo-te. Numa sempre diversa realidade"